Exposições
20 Agosto 2019 - 05 Outubro 2019
Espaço Cultural Marcantonio Vilaça / Brasília, Brasil
Aline Motta, Ponte sobre Abismos #3, 2017. Cortesia da artista.
A exposição Em três tempos: memória, viagem e água apresenta trabalhos em vídeo e fotografia de Aline Motta. São desdobramentos de uma exploração da artista pelas raízes de sua família, que a levou a lugares como Vassouras/RJ, Mariana/MG, Serra Leoa, Nigéria e Portugal.
Sua pesquisa estimula diálogos sobre identidade, representação e a formação das famílias brasileiras, muitas vezes permeados por segredos e omissões. Ao investigar vestígios de seus antepassados em arquivos públicos e privados, promove uma busca que, embora íntima e pessoal, reverbera em todos os que tiveram suas origens apagadas pela escravidão.
Trabalhando com os limites entre a memória pessoal e a coletiva, entre o que se lembra e o que se deixa esquecer, Aline Motta produz imagens diaspóricas, com movimentos de contrafluxo a reclamar sua vida também no presente. Nesse contexto, também sugere uma discussão sobre a visibilidade da produção negra. Sua proposta lança luz sobre essas questões de maneira poética, em um ambiente propício à imersão, que convida o visitante a mergulhar em suas próprias vivências e memórias.
Texto do curador: Memória, esquecimento, escavação paciente e descoberta estão entre os assuntos que aparecem na obra de Aline Motta, artista fluminense, 44 anos, que mora e trabalha em São Paulo.
Três anos após realizar a instalação e o livro de artista Escravos de Jó, 2016, a artista segue interessada nas histórias ligadas à escravidão negra, e de como sua família, de um lado portuguesa, de outro, africana e afro-brasileira, é atravessada por essas relações desiguais que definem as particularidades da sociedade brasileira. Agindo como uma catadora de farrapos orais, visuais e escritos das histórias encobertas de sua família, Aline Motta faz uma incursão a lugares distantes entre si, aproximados, entretanto, pelo Oceano Atlântico, alinhando-os em uma obra repleta de água – salgada, doce, transparente ou poluída. Essa substância aparece como um elemento estrutural na trilogia de vídeo-instalações – Pontes sobre abismos (2017), Se o mar tivesse varandas (2017) e Outros fundamentos (2019), pela primeira vez apresentadas juntas.
A busca de suas raízes familiares tem um marco importante – Doralice, bebê de cor parda que nasceu em 1911 no Rio de Janeiro, e que, um dia, viria a ser sua avó materna. Aline Motta encontra outros nomes de pessoas, como sua bisavó, Mariana (1888-1960), nomes de ruas, produtos do comércio, notícias da imprensa e eventos históricos que se atravessam. Tais descobertas sinalizam o modo que a artista encontrou para lidar com os fatos étnico-raciais em sua família, ou seja, o gosto por saber do passado, com vistas a melhor entender seus efeitos no presente. Essa vontade de saber a engaja em viagens nas quais conhece pessoas e localidades, matéria prima da trilogia em que, como se poderá ver, emerge um efeito de vaivém entre lugares.
Alguém em Serra Leoa banha os retratos impressos em tecidos brancos na água, uma jangada carrega os rostos de um casal. Noutro momento o retrato em tecido de Wilma (1939-2011), mãe da artista, é segurado por outrem em Lagos/Nigéria dentro de uma pequena embarcação; noutras vezes essas imagens moles, posto serem os tecidos muito delicados, são penduradas em varais; o vento as movimenta sob as ruínas do que outrora fora um lugar habitado. Uma vez ampliados em relação aos originais, esses retratos ganham uma vida nova, saem das gavetas, álbuns ou caixas de sapato, lugares nos quais vivem silenciosamente recolhidos à espera de quem, com curiosidade e rigor, lhes interpele sobre quem e de onde eram, e o que legaram a nós, os vivos.
Alexandre Araujo Bispo
Espaço Cultural Marcantonio Vilaça Centro Cultural TCU/ISC Setor de Clubes Esportivos Sul – SCES, Trecho 3, Lote 3, 1° Subsolo, Brasília/DF Visitação: de segunda à sexta, das 9h às 19h. Sábados, das 14h às 18h.
https://portal.tcu.gov.br/espaco-cultural-marcantonio-vilaca/home/