O ano de 2020 permitiu ao artista visual burquinense Koffi Mensah ter seu primeiro contato com o Brasil por meio da residência virtual Vila Sul, do Goethe-Institut Salvador-Bahia. Nascido em 1982 em Lome (Togo), Mensah reside há muito em Uagadugu (Burkina Faso). Um de seus projetos, que retrata personalidades africanas sobre telas, instigou um grupo multidisciplinar de interessados e especialistas brasileiros a analisar suas obras e a dialogar (online) com o artista. Através de um processo de reconhecimento e tributo, entendido como ato de homenagem, Mensah reafirma a presença de personalidades africanas do âmbito político-cultural que contribuíram para a formação das identidades de seu continente.
“Trabalho para resgatar a memória de políticos e músicos africanos que fizeram coisas importantes e positivas para o continente, mas são simplesmente esquecidos”, afirma o artista. Sua obra, de significativa potência metafórica, contribui para que seja possível resistir ao esquecimento dessas personalidades que normalmente teriam suas imagens e narrativas apagadas da memória popular – fator que as torna quase ausentes da versão difundida como “oficial” da história africana. Ou seja, os personagens retratados por Mensah saem do limbo da memória coletiva, visto que haviam sido anulados da história regularmente narrada segundo uma visão hegemônica eurocêntrica.
Ao representar apenas personalidades negras e africanas, o artista reformula visualmente a historiografia “oficial” ensinada e propagada no continente, já que, “nas escolas na África, por exemplo, os alunos aprendem pouco sobre nossa própria história. Ensina-se muito mais sobre a história ocidental e pessoas ocidentais, em uma espécie de manutenção do colonialismo. Quero que, com o meu trabalho, o espectador se lembre de personalidades africanas e de nossa própria história”, propõe Mensah.
Reescrevendo a historiografia pan-africana
Haile Selassie (imperador da Etiópia e figura central do Movimento Rastafári jamaicano), Amílcar Cabral (líder político da Guiné-Bissau e de Cabo Verde) e os músicos Manu Dibango (Camarões/França) e Akon (Estados Unidos/Senegal) são alguns exemplos a quem Mensah presta sua homenagem. Com tais retratos, o artista assume as rédeas das narrativas históricas africanas que foram – e ainda são – enterradas devido ao eurocentrismo e à “colonialidade”.
O artista reescreve a historiografia pan-africana, partindo de corpos sociais que se tornam fragmentos-emblemas de uma nova cartografia internacional, desafiando assim as escritas históricas hegemônicas ocidentais sobre o continente africano. Mensah chama também a atenção para figuras provenientes de diferentes países, evocando assim um novo olhar sobre a África e se distanciando de imagens de precariedade, expropriação ou exploração como são comumente reportadas.