O segundo ponto de acesso leva o visitante diretamente para o centro da exposição, onde está acumulada uma grande quantidade de conteúdo num espaço pequeno. Divididos em minissalas de exposição, alguns dos tópicos abordados são criação da raça e constituição do racismo científico, estereótipos e fascínio pelo negro que entretém, além de manifestações músico-político-culturais como o Tambú. Completam o panorama entrevistas com acadêmicos, espaço para depositar perguntas, cartelas com informações acerca de figuras históricas relevantes, mapas coloniais e fotos que registram a existência dos chamados “zoológicos humanos”. Os esforços em cobrir uma ampla gama de questões podem indicar o quanto essas histórias foram apagadas do imaginário coletivo holandês.
Afterlives of Slavery é descrita como um “prelúdio à exposição sobre a história colonial dos Países Baixos, a ser inaugurada no Tropenmuseum em alguns anos”. Por isso mesmo o potencial por detrás de alguns dos conteúdos deve ser observado. A seção que aborda as reivindicações de ativistas para a “criação de mais espaços para perspectivas e ideias não eurocêntricas”, bem como a porção que joga luz na perniciosa tradição do Zwarte Piet (“Pedro, o negro”), podem representar um poderoso giro decolonial.
No terceiro ponto de acesso, a arquitetura do palácio induz o visitante a atravessar outras três exposições atualmente em cartaz no Tropenmuseum que investigam o Sudeste da Ásia, a Indonésia e Papua Nova Guiné, o que representa um significativo contraste com as abordagens curatoriais de Afterlives of Slavery. Iniciar a visita por esse ponto deixa uma sensação de frustração, pois a percepção é de que o olhar colonial permanece inalterado.
Um dilema reside na raiz de Afterlives of Slavery e em seu desdobramento daqui a alguns anos: como sensibilizar para o reconhecimento do empreendimento colonial como um fato violento que necessita de reparação, mas, ao fazê-lo, evitar negar a agência para subalternizados cuja produção artística passa pela dor, mas vislumbra a forja de futuros? Tal reflexão pode levar ao surgimento de uma possibilidade real de avistar as vidas dos nossos corpos racializados após aquela “instituição peculiar” chamada escravidão. Senão, um título como “Vidas pós-escravidão” não significará nada mais que um simulacro. Nesse prelúdio, a exposição parece ter o entendimento de que um mundo pós-colonial emergirá por meio do mero reconhecimento do passado colonial. Os debates raciais nos Países Baixos estão em estágio tão embrionário a ponto de que a simples admissão do empreendimento colonial é vista como uma conquista importante?