O Brasil hoje

O horror se estabelece

Mesmo onde o cotidiano brasileiro ainda parece estar em ordem, a retórica repressora de Jair Bolsonaro se instala. Um relato do mundo da arte de São Paulo.

Está ficando desconfortável – para todos

No dia seguinte, pedalo com minha bicicleta alugada por um belo bairro de artistas em direção à próxima exposição. A Vila Madalena também parece ser um refúgio que só vai sendo lentamente arrebatado pela nova realidade. Até poucos anos atrás, as casinhas coloridas do bairro eram vistas como pontos de concentração de pessoas alternativas e criativas. Hoje também representam a São Paulo de melhor renda, protegida do mal social das periferias urbanas. É verdade que cada vez há mais incidentes em que apoiadores de Bolsonaro, com suas arruaças, trazem insegurança a teatros alternativos críticos, galerias e bares gays. Mas o inimigo real parece ser composto pelos ultraconservadores na precariedade das periferias. No setor da população que poderia ameaçar o centro da prosperidade urbana.

“E olhe que vivemos aqui numa bolha absoluta”, diz um cientista político amigo que vive no bairro. Em sua vizinhança, as reduções no setor social, cortes em programas de educação ou ações afirmativas provavelmente terão efeitos controláveis. Pelo menos a vida entre lojas de comida natural e cafés hipster parece impressionantemente parecida com a que se leva em meu ambiente alemão. Concordando, aceno a cabeça nas conversas sobre novos direitistas, práticas invasivas de observação nas escolas – também em voga no partido alemão Aliança para a Alemanha – e estranhamento entre periferia e centro, artistas, curadores e ativistas LGBT. Tento entender como uma pessoa se sente quando seu próprio ambiente está ameaçado de forma aguda. E me pergunto por quanto tempo meu bem-estar será poupado.

Elisabeth Wellershaus nasceu em 1974 e vive em Berlim. É jornalista e trabalha, entre outros, para a revista de arte “Contemporary And”. Participa da redação da página cultural online “10 nach 8”.

Traduzido do alemão por Renata Ribeiro da Silva.

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