C&: Boa parte de sua prática está relacionada com localização e lugar e com a forma através da qual você se descreve como afro-chicana.
LC: Realmente divertido em How to Respond to Social Emergencies foi que alguns dos artistas participantes já se conheciam há anos, enquanto muitos nunca tinham se encontrado antes. Ver a sincronicidade dos trabalhos e dos materiais que escolhemos me fascina. Uma das coisas que penso sobre quilts é que eles refletem a tradição dos negros do sul na forma como as histórias são costuradas neles, como mapas que guiam para o norte. Muitas vezes, quando pensamos no Underground Railroad, as rotas secretas de fuga dos negros, não pensamos na enorme onda migratória em direção ao México, já que o México tinha abolido a escravidão. Eu frequentemente penso em mim mesma como uma sulista/artista do Sul Global, e portadora dessas histórias, tradições e conhecimentos.
Sou altamente influenciada pelo bordado e pela forma como ele é usado no México para identificar sua tribo e o seu povo. Antes dos anos 1960, não tínhamos esses outros espectros de cores que resultaram dos pigmentos artificiais introduzidos no mercado. Antes disso, trabalhávamos com tinturas naturais de insetos, plantas e frutas das nossas comunidades, o que novamente me remete à tradição amorosa e à relação com a terra.
Usar a criatividade de forma pioneira é um espaço tão vulnerável. Especialmente sendo artistas negras e negros, estão sempre esperando que falemos sobre o trauma e a violência que ocorrem em nossas comunidades. Mas somos seres complexos, há tanta coisa mais sobre nós. Então, será que as outras coisas podem ser celebradas, por favor?
C&: Isso parece muito específico do sul dos EUA: como influencia sua abordagem do trabalho?
LC: Sou da Luisiana, da Diáspora Negra e a terceira geração do que chamamos Texas. E meus bisavós um dia migraram do México. O sudoeste foi por muito mais tempo o que se conhece como México do que Estados Unidos, e é importante que pensemos nessas histórias. Acho que reivindicar uma identidade de afro-chicana é como um suave “foda-se” ao sistema, porque fomos arrancados dessa identidade. Isso também afirma que podemos definir o lar e que o lar também pode estar em muitos lugares, o que é igualmente bom. O Texas, e Houston especificamente, tem essa dinâmica realmente interessante, porque é uma cidade portuária próxima a Galveston. Ela oscila entre uma relação Norte e Sul, entre o Sul e o Norte globais e entre a historiografia do sudoeste e do sudeste.
C&: Em que você está trabalhando no momento?
LC: Atualmente, estou trabalhando numa obra de tecido em larga escala que vai medir 6,09 x 6,09 m, intitulada Suficiente Sustento. Em torno desses trabalhos, haverá várias peças penduradas contendo diferentes lembretes gentis convocando à tomada de espaço. É um convite para aqueles que se definem como folks of color pertencentes à comunidade não-binária, indígena, pobre ou à classe trabalhadora. Todas essas pessoas podem levar consigo uma das pequenas peças penduradas e qualquer pessoa que se identifique como branca e/ou rica pode fazer uma doação para a causa e também levar uma peça para casa.
Leticia Contreras é uma artista multidisciplinar e gestora cultural queer, afro-chicana, nascida e criada em Houston, Texas. Seu trabalho aborda temas da memória incorporada, alegria radical, bem como nosso relacionamento mútuo e com o meio ambiente. Ela utiliza materiais extraídos da natureza tanto como inspiração quanto como instrumento. Leticia trabalha com uma variedade de mídias, entre elas fotografias, instalações e performances, para revelar as histórias de um lugar. Espectadores cruzam a fronteira entre o testemunho e a participação.
Nan Collymore escreve, programa eventos de arte e produz ornamentos de latão em Berkeley, na Califórnia. Nascida em Londres, vive nos Estados Unidos desde 2006.
Traduzido do inglês por Soraia Vilela.