Conferências
15 Outubro 2019 - 16 Outubro 2019
MASP / São Paulo, Brasil
Este é o segundo seminário de um projeto de longo prazo realizado desde 2018 em conjunto com o Afterall, centro de pesquisa e publicação da Universidade de Artes de Londres voltados à arte contemporânea e à história das exposições. O primeiro seminário aconteceu em outubro de 2018 com a participação de Bambi Ceuppens, Candice Hopkins, Elizabeth A. Povinelli, Estefanía Peñafiel Loaiza, Esther Gabara, Julieta González, Lewis R. Gordon, Luciana Ballestrin Nelson Maldonado-Torres, Rolando Vázquez, Shela Sheikh, Suely Rolnik e Yaiza Hernández Velázquez.
O seminário é um fórum em que teóricos culturais, curadores e artistas da América do Sul, África, Estados Unidos e Europa levantam questões e propostas para a reinterpretação não canônica e descolonizada de mostras e coleções de museus. Os participantes falam das novas práticas artísticas e curatoriais, que explicitamente questionam e criticam os legados coloniais na produção artística, curadoria e crítica de arte. Pretende-se que o evento estimule novas discussões e pesquisas sobre descolonização, estudos decoloniais e pós-coloniais.
Programação:
Terça-feira, 15.10
10h Introdução com Adriano Pedrosa e Mark Lewis.
10h30 – 12h30 WANDA NANIBUSH Por que descolonizar um museu quando você pode centralizar a arte indígena Um debate sobre a centralização em contraponto a estratégias de descolonização da coleção e da exposição de arte indígena. Também sobre o papel da arte indígena contemporânea em qualquer tentativa de prática decolonial por parte de museus.
JOTA MOMBAÇA O Labirinto da Casa Grande: representação e futuridade O Labirinto da Casa Grande será estudado não apenas como uma figura histórica, associada ao momento total do sistema colonial escravista, mas como um descritor do mundo-como-conhecemos e dos modos de atualização da infraestrutura global derivada da modernidade-colonialidade e, portanto, implicada na continuidade das sujeições negra e indígena através do tempo. As noções de representação e futuridade serão, portanto, questionadas com vistas ao seu entrelaçamento com as infra e intra-estruturas econômicas e simbólicas. Assim é que, do ponto de vista político, a apresentação buscará tocar os limites das políticas de representação e as possibilidades generativas de uma futuridade que não obedeça nem à linearidade do tempo nem aos cativeiros do realismo e da representatividade.
GABI NGCOBO Desintoxicar faz parte da descolonização da “inocência” colonial Nesta apresentação, Gabi Ngcobo discutirá o movimento cada vez mais urgente em direção à descolonização da arte e de suas instituições. Também apontará como, nesse processo, corremos o risco de que aqueles que ocupam posições de poder se apropriem dos mesmos discursos através dos quais foram criticados e aos quais foram chamados a se responsabilizar. Ngcobo se baseará em projetos colaborativos recentes, com especial foco em All in a Day’s Eye: The Politics of Innocence in the Javett Art Collection, no recém-inaugurado Javett Art Center da Universidade de Pretória. A exposição é inspirada na coleção da família Javett, com obras de artistas que produziram a partir do século 20 com diferentes temas, tais como políticas de educação, inocência, políticas espaciais, religião e espiritualidade, natureza, políticas de representação e histórias de trabalho.
14h – 16h NANA ADUSEI-POKU Reimaginando o santuário da indústria e dos sonhos – o desafio da perda curatorial Este diálogo interdisciplinar usa de maneira especulativa, entre outros exemplos, a vida, a obra e as aspirações da escultora nova-iorquina Augusta Savage para se engajar em questões de perda e abordagens decoloniais à curadoria. Como podemos curar e nos engajar com a obra e o legado de artistas cuja biografia e trabalho estão intrinsecamente ligados ao resultado de uma violência epistêmica e sistemática que moldou suas existências? De que forma podemos transmitir a ausência como ferramenta do contemporâneo? Como podemos estar envolvidos com o cuidado e expressar curatorialmente algo que Adusei-Poku defende estar embutido nas Culturas Negras – a ideia de uma atualização que ainda não se fez presente?
ROBERT ALDRICH Revisitando os museus coloniais: o problema da descolonização e os legados do império Museus criados para exibir arte e artefatos de países conquistados – além das “conquistas” europeias além-mar – constituíram parte importante de projetos coloniais nacionais. Com a descolonização, tais instituições perderam a razão de ser como condutores da propaganda colonialista, e desde então tiveram, em mais de uma ocasião, de se reinventar. Ao revisitar os antigos museus coloniais de Amsterdã (Tropenmuseum), Bruxelas (Africa Museum) e Paris (hoje um museu da imigração), Aldrich levará em conta os modos e graus de sucesso de três museus em “descolonizar” suas coleções e apresentações. Ele também discutirá alguns problemas contemporâneos quanto ao legado do colonialismo nos museus, que inclui a repatriação de objetos, além das controvérsias ligadas aos novos ou propostos museus em Berlim e Londres.
Quarta-feira, 16.10
10h30-12h30 KAILANI POLZAK Criando histórias materiais: a interpretação polivocal e as coleções institucionais Nesta apresentação, Polzak falará de uma mostra recente, da qual foi curadora, no Museu de Arte do Williams College. Ao recuperar as histórias que ligam o Williams College ao Reino do Havaí, a mostra se valeu inteiramente de coleções da universidade. Das taxonomias empregadas pelo banco de dados do museu à paisagem da universidade, havia pouca coisa disponível sobre essas histórias para os integrantes da comunidade universitária. Assim, Polzak e Sonnet Coggins, sua parceira na curadoria, tomaram decisões interpretativas específicas que focassem a atenção do espectador no poder da nomenclatura e narrativa. Seja revelando a fragilidade e o equívoco da antiga prática museológica de categorização dos objetos, seja se deleitando nas diversas perspectivas propiciadas pelos contribuintes de ascendência indígena e colona (entre alunos, professores, curadores e pastores), o projeto tratou tanto das histórias da relação Williams-Havaí quanto da própria prática da história da arte.
PEDRO DE NIEMEYER CESARINO Corpos e objetos teimosos: exibição e classificação das coisas dos outros A apresentação versará sobre a conexão entre corpos e coisas em sociedades não ocidentais, tais como as ameríndias, e os dilemas relacionados às suas reconfigurações pelos dispositivos institucionais e regimes conceituais associados à noção de arte. Pretende-se oferecer uma reflexão sobre o estatuto ontológico de coisas associadas às concepções de pessoa marcadas pela multiplicidade, partibilidade e conectividade, potencialmente irredutíveis aos modos de classificação e categorização de objetos pelos regimes imperiais.
ROSANE BORGES Descolonização do olhar: desafios para as artes visuais Grupos historicamente discriminados estiveram, quase sempre, na condição de mercadorias de olhares. Da seleção e escolha dos corpos negros para o mercado escravocrata-colonial até os tempos atuais, testemunhamos um sistema visual, com gramática própria, que dá suporte a formas de negação que se mostraram exitosas para a construção de linhas divisórias entre “nós” e os “outros”, entre “civilizados” e “bárbaros”. É evidente e incontestável o papel das artes visuais para o êxito deste empreendimento. A despeito das mudanças que vêm sendo operadas nos últimos anos, a ingerência do olhar colonizador ainda produz efeitos devastadores sobre os modos de produção e recepção da imagem. Esta discussão tem como propósito apresentar uma defesa em torno da necessidade de descolonizarmos o olhar, a fim de quebrar com estruturas enrijecidas que colocam grupos subalternizados (negros, indígenas, mulheres, LGBTQI+) em prisões de imagens.
14h-16h LEA VAN DER VINDE Repensando o legado colonial de Johan Maurits de Nassau-Siegen no Mauritshuis O Mauritshuis recebe o nome do homem que o construiu: Johan Maurits of Nassau-Siegen – conhecido no Brasil como Maurício de Nassau. Do ponto de vista de um museu de arte, o Mauritshuis costumava enfatizar em primeiro lugar sua importância para a arte, a arquitetura e a ciência. No entanto, a história de vida de Johan Maurits é também parte da história colonial holandesa, em particular do tráfico transatlântico de escravos – temas dos quais mal se falava no museu até recentemente. Esta apresentação refletirá sobre o processo de uma consciência crescente em relação ao modo como o Mauritshuis divulga informações sobre Johan Maurits ao público, que resultou, entre outras coisas, na mostra Imagem em mutação – em busca de Johan Maurits (4 de abril – 7 de julho, 2019). A exposição examinou diversas perspectivas sobre Johan Maurits e o Brasil holandês. Serão compartilhados alguns dos desafios da curadoria, que também se relacionam com a polarização da discussão pública sobre Johan Maurits e a história nacional holandesa.
LILIA MORITZ SCHWARCZ Mecenato imperial no passado e no presente: exposições permanentes e projetos curatoriais em alguns museus brasileiros Os estudos pós-coloniais realizaram, desde os anos 1970, uma verdadeira virada epistemológica ao questionar narrativas eurocêntricas até então entendidas como modelos civilizatórios universais, evolutivos e obrigatórios. Interpelaram também várias áreas do conhecimento, como a crítica literária, as ciências sociais, a política, a história, a filosofia, bem como a história da arte e as práticas museológicas. O objetivo desta apresentação será analisar como obras acadêmicas produzidas no Brasil do século 19, sob o mecenato do imperador Pedro II, são atualmente apresentadas em instituições como o MASP, a Pinacoteca e o Museu de Belas Artes. O suposto é que elas ainda figuram de maneira naturalizada, como se fossem etnografias ou documentos visuais de eventos passados. Também interessa comentar os projetos curatoriais em que elas se inserem e que tendem a eleger a diacronia como critério objetivo. Trabalharemos com obras de Pedro Américo de Figueiredo e Melo, Victor Meirelles e José Maria de Medeiros.
LUIZ FELIPE DE ALENCASTRO Territorialidade e descolonização: o caso brasileiro A história colonial do Brasil não se restringe ao território colonial brasileiro. Paulistas invadiram terras espanholas no Cone Sul para saquear aldeias e escravizar indígenas. Mais ainda, os colonos do Brasil e depois os brasileiros – e não só os portugueses – participaram ativamente da pilhagem do território e dos povos angolanos e africanos de outras áreas da África. Entre meados do século 17 e início do século 18, pelo menos 13 expedições militares embarcaram no Brasil para auxiliar os colonos de Angola na expansão das redes de tráfico negreiro. Navios de bandeira brasileira foram aos portos africanos embarcar escravizados vendidos por seus agentes locais de 1822 até 1850. Assim, o debate sobre colonização e descolonização envolve, no caso brasileiro, a relação dos colonos e das comunidades dominantes nacionais com os índios, e também com os africanos.
16h30-17h30 Conferência
MARZ SAFFORE Descolonizando nossas instituições/Descolonizando nossas cidades Esta apresentação abordará o trabalho do Decolonize This Place (DTP), movimento com sede em Nova York voltado à ação em seis frentes de luta: luta indígena, libertação negra, Palestina livre, demolição do patriarcado, trabalhadores assalariados do mundo e desgentrificação. Como artistas, educadores, escritores, ativistas e organizadores, temos buscado perturbar e tornar nossas instituições responsáveis pelas pessoas a quem elas afirmam servir e representar, exigindo a revogação do projeto colonialista tocado por elas. Marz Saffore, integrante do Colletivo MTL+ (fundadores e facilitadores do DTP), compartilhará trabalho e experiências como ponto de partida para uma discussão mais ampla sobre como a organização decolonial e a ação direta podem ser vistas em nossas cidades.
INSCRIÇÕES GRATUITAS NO DIA DO EVENTO A retirada de ingressos será realizada uma hora antes do início do seminário, na bilheteria do museu. Cada entrada é válida para um dia de evento. Para acompanhar os dois dias, é preciso retirar ingresso nas duas datas.
Para receber o certificado de participação, é necessário cadastrar e-mail e nome completo e apresentar um documento oficial. Os certificados serão enviados para o e-mail cadastrado dos que comparecerem aos dois dias de seminário.
Organização: Adriano Pedrosa, Amanda Carneiro, André Mesquita, Caroline Woodley e Mark Lewis, com a colaboração de Yaiza Hernández Velázquez. Mediação: Amanda Carneiro, Fernando Oliva, Isabella Rjeille, Olivia Ardui e Tomás Toledo
MASP Av. Paulista, 1578. 01310-200 São Paulo, Brasil Visitação: Terças, das 10h às 20h. Quarta a domingo, das 10h às 18h.
masp.org.br