Conversa com Jamilah Sabur

Conectando a América do Sul e o Caribe

Jamilah Sabur é uma artista multidisciplinar nascida na Jamaica e radicada em Miami. Em sua mais recente exposição individual, a artista utiliza videoinstalação e esculturas para tecer narrativas que relacionam o lar de infância de sua mãe na Jamaica à história de Simón Bolívar. C& conversou com Sabur sobre a reconexão de elementos através da arte e sobre como podemos nos tornar mais humanos.

C&: Por que, ao lidar com memórias, decidiu combinar obras 2D e vídeos? 

JS: Minha maneira de agir sempre foi multimodal. Realmente não vejo diferença na maneira em que construo uma escultura, um espaço, performance ou texto; tudo sempre passou uma sensação de proposta. Recentemente descrevi minha maneira de trabalhar como arranjar canais entre elementos que se associam. Nesse caso, na exposição If Defined, Then Undefine (Se definido, indefina), na Dimensions Variable, os gestos em vídeo e 2D eram de interações com a memória da minha mãe sobre a amendoeira que ficava no quintal da frente.

C&: O que há de tão particular na relação entre o Caribe e a América do Sul? 

JS: Crescendo em Miami, sempre tive a sensação de estar numa extensão da região. Miami é como um laboratório onde posso investigar a dinâmica social e a multiplicidade de histórias. Assim, vivo me pegando em situações em me questiono sobre as histórias que são silenciadas. Recentemente tenho passado muito tempo olhando para o passado, a história do genocídio e da escravidão nessa região, com o intuito de conectar os pontos que os ligam às condições atuais – com isso, posso registrar, reviver, reagrupar, reconstruir e reimaginar. Estou obcecada em pensar sobre um Caribe latino-americano menos patriarcal, unido, igualitário e sem fronteiras. A Guerra do Clima está aí, e é hora de abrir mão do conceito colonial que temos sobre o território e sobre nós mesmos.

C&: Quanto de você mesma e de suas próprias experiências está em seu trabalho? 

JS: É difícil dizer o que é minha experiência e o que não. Acredito em expandir a imaginação empática e estou sempre tentando expandir a minha. Parte disso é perceber que sua mente e seu corpo são realmente sempre a base para uma analogia com outras pessoas. Você não tem escolha senão entender os outros através de você mesmo, e penso que toda minha obra vem disso, que sou eu. Entretanto todos temos um âmbito de imaginação, que dá forma a nós mesmos e a nossa identidade. Por exemplo, eu posso ter um conceito de “América” ou de “condição de mulher” limitado a uma experiência muito particular e reduzida. Uma grande porção de qualquer identidade que tenhamos – quem somos – tem de vir de fora de nós. Não acho que percebemos isso, mas esquecer isso é um convite à rigidez e à insensibilidade, porque consideramos o que somos acima de qualquer questão. Consideramos muito nossa identidade? Se enxergássemos o quanto de nós mesmos é constituído de substâncias efêmeras e fantasmagóricas, acho que nos tornaríamos mais humanos. Com certeza, há muitas experiências em minha vida que me fazem ter vontade de entender o âmbito da imaginação, sua dimensão e suas fronteiras. Ser negra, ter crescido sem documentação, geralmente lhe proporciona muitos tipos de experiências como essas. E atualmente ter membros da família com problemas de imigração, com o surgimento da questão sobre se a nação vai incluí-los em seu autoconceito, isso tem sido importante, então a falta de empatia é importante.

C&: O que você acha interessante a respeito da história de Simón Bolívar na Jamaica? 

JS: Ele esteve em exílio na Jamaica, antes de retornar e se envolver em tantas revoluções na América do Sul. As nações do Caribe, da América do Sul e da América Central têm uma origem em comum, portanto há muita base para sentimentos em comum e entendimento. Mas esse não é um espaço que habitamos – o trabalho negligenciado de elaborar algum tipo de conexão e a facilidade de evitar as consequências dos ideais que figuras como Bolívar trazem à tona são tão poderosos. Olhando para a trajetória da perspectiva da Jamaica em 1815 através de Bolívar, pude superar minha visão míope e enxergar todo o teatro da guerra que se efetuava nesse período.

Jamilah Sabur, If Defined, Then Undefine (Se definido, então indefina), esteve em exposição na Dimensions Variable, Miami, em setembro de 2017.

Entrevista por Will Furtado.

Traduzido do inglês por Renata Ribeiro da Silva.

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