Exposiciones
05 diciembre 2018 - 03 febrero 2019
MAC do Ceará - Dragão do Mar / Fortaleza, Brasil
Fotos: Fernando Banzi.
Até o século XIX o retrato pintado a óleo sobre tela era um privilégio das camadas mais abastadas das sociedades. Ocupando o espaço central do quadro, posado na frente de um fundo contextualizado e cercado por mobília, adornos e adereços, o retratado impunha ao espectador a visão que este deveria ter, de reverência e adoração, na esteira da arte religiosa. Personalidades foram perpetuadas em palácios, igrejas, museus, escolas, bibliotecas. E assim, através do retrato, herdamos uma escala de valores que usamos para lembrarmos e sermos lembrados.
O advento da fotografia no século XX provocou uma transformação. Popularizou o retrato e permitiu que outras camadas sociais, sobretudo as surgidas na Revolução Industrial, tivessem acesso a essa perpetuação da própria imagem. Pudemos enfim colocar as personalidades nas paredes das salas de casa e reverenciá-las. Só que elas eram mais próximas, não menos personalidades: eram os nossos ancestrais.
No Brasil, a partir da década de 1930, em algumas capitais se estabeleceram estúdios populares que além de retratos produziam fotos para documentos de identidade, carteira de trabalho e recebiam encomendas vindas do interior. Eram os chamados «foto-estúdios», localizados em regiões centrais de comércio e que também realizavam uma modalidade muito particular de retrato em cópias colorizadas.
No início da década de 1950, com a introdução da película e do papel em cores na fotografia, o uso dessa técnica diminuiu, mas a força do retrato se manteve. A partir da Consolidação das Leis do Trabalho, em 1943, todo cidadão pôde ter um documento com um retrato e uma representação na sociedade. O retrato 3×4 da carteira de trabalho introduziu os homens e mulheres do povo a uma certa cidadania. Eles posavam nos foto-estúdios com suas roupas de domingo, num ritual feito de alguma preparação e cerimônia, como num rito de passagem.
As ocasiões pediam: eram casamentos, batizados, aniversários, a chegada ou partida de alguém – eternizados em cópias e encadernações caprichadas entregues pelos foto-estúdios. Elas durariam gerações.
Mais tarde, a partir dos anos 1960, as câmeras portáteis e automáticas representam o primeiro passo para a banalização desse ritual. O retrato, agora feito pela própria família, quase sempre pelo pai, desvincula-se do olhar sagrado e formal, passando a registrar o cotidiano, banal e doméstico. Com advento da câmera digital anos 1990, a identificação em documentos e nas portarias banaliza ainda mais o retrato e, a partir dos telefones celulares, fortalece em escala maciça a auto-imagem, o autorretrato. É a era das selfies, que voltam a banalizar o retrato, mas não só ele desta vez. As selfies vulgarizam as ações cotidianas e a privacidade. Cada momento é dissecado e estendido até a fissura do real, desconstruindo a auto-imagem à beira da obscenidade, ou seja, mostrando o que está além da cena e do que deve ser visto publicamente.
Com as selfies registramos nossos passos e nossas ações desprovidos de cerimônia, com toques de exibicionismo e solidão. E tudo é eternizado nas redes de relacionamento virtual: o indivíduo aos olhos da multidão.
A mostra é composta dos núcleos: “Os Outros”, “Sobre Cor da Sua Pele» e “Quem Somos Nós”.
Artistas José Irineu de Souza. Octacílio de Azevedo. Estúdio Sacoman – Família Kagaya. Telma Saraiva. Mestre Júlio Santos. Estrigas. Antonio Bandeira. J.P Chabloz. Inimá de Pauala. Ernesto Barroso. Lu Miranda. Gentil Barreira. Chico Albuquerque. Mariana Pabst, Alice NM. Fernando Banzi. Rodrigo Bueno. Efrain Almeida. Roberto Setton. Zé Albano. Bruno Moreschi. Bruno Weis. Sigbert Franklin. José Guedes. Alfonso Albano. Fernando Lemos. Jared Domicio. Pat Woolham. Caetano Dias. Rian Fontenele. Sérvulo Esmeraldo. Celso Oliveira. Solon Ribeiro. José Tarcísio.
Curadoria Rosely Nakagawa é curadora e arquiteta. Nasceu em 1954 em São Paulo, Brasil onde vive e trabalha. É graduada em Arquitetura pela FAU-USP em 1977. Fez especialização em Museologia pela USP, em 1978/80, e em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, em 2005. Desenvolveu atividades de curadoria em diversos espaços e galerias, entre eles o Armazém Cultural 11, a FNAC Brasil, a Casa da Fotografia FUJI, o Festival de mídia eletrônica VideoBrasil, o SENAC Escola de Comunicações e Artes, Núcleo Amigos da Fotografia NAFOTO, no qual realizou o I , II e III Mês Internacional de Fotografia e Seminário Internacional da Fotografia. Foi curadora também do Espaço Cultural CITIBANK.
É membro da Rede Nacional de Produtores de Fotografia, do Conselho do Paraty em Foco, do Instituto Choque Cultural SP, do Conselho Curador do Centro Cultural Memorial da Cultura Cearense CE e do Conselho da Associação Cultural Videobrasil SP.
Participa de encontros e semanas de fotografia desde 1985, no Brasil e exterior, e edita livros de fotografia em parceria com as editoras Tempo d’Imagem, Cosac Naif, DBA e Terceiro Nome. Entre os títulos publicados estão Thomaz Farkas Fotógrafo (DBA); Thomaz Farkas: Notas de Viagem (Cosac Naify); Encontros com a Fotografia (FNAC e Tempo d’ Imagem); Luis Humberto: Do Lado de Fora da Minha Janela, do Lado de Dentro da Minha Porta (Tempo d’Imagem), Júlio Santos: Mestre da Fotopintura (Tempo d’ Imagem e Funarte); Benedito Duarte (Cosac Naify); e De sol a sol – O Japão que nasce no Brasil (Editora Terceiro Nome).
MAC – Museu de Arte Contemporânea – Dragão do Mar R. Dragão do Mar, 81. Praia de Iracema, Fortaleza/CE Visitação de terça a sexta-feira, das 9h às 19h, com acesso até às 18h30; e aos sábados e domingos, das 14h às 21h, com acesso até às 20h30.