Amazônia

Jota Mombaça investiga ciclos hídricos desequilibrados na Alemanha e na Amazônia

A exposição de Jota Mombaça no CCA de Berlim explora a topografia da cidade, construída sobre pântanos drenados, ao mesmo tempo em que conecta Berlim à floresta amazônica do Brasil, através de suas condições planetárias compartilhadas. Jota emprega engajamento elementar ao submergir vasos de cerâmica em um lago local e convidar água e lama a tomar conta do espaço da galeria.

Mombaça apresenta também um vídeo intitulado until the last morning (até a última manhã – 2023), encomendada especialmente para esta exposição. Nela, a câmera acompanha diferentes visões do céu presenciadas no estado do Pará, na Amazônia brasileira. A lente revela “uma coreografia de nuvens que reage a um regime local divergente daquele da localidade de Berlim”, diz ela. “No entanto, eles estão mutuamente envolvidos por uma condição planetária compartilhada: o desequilíbrio dos ciclos de água e seus efeitos imprevisíveis nos modos de habitação humanos.”

Em sua prática, a artista tem lidado continuamente com os efeitos e as consequências da(s) modernidades(s) colonial(is) e com as realidades brutais que ela(s) impõe(m) até hoje a corpos racializados e marginalizados. No passado, ela submergiu esculturas feitas de tecido de algodão ou linho na Lagoa de Veneza, em um canal de Amsterdã, bem como em comissões produzidas na Baía de São Paulo, na área da Baía de São Francisco, e no Oceano Pacífico. Jota Mombaça provoca questões e anseios por (um) outro(s) mundo(s), que implicam a capacidade de oferecer e criar espaço para uma plenitude de corpos e seres. A fisicalidade e as relações físicas com vários materiais desempenham, portanto, papéis cruciais na prática de Mombaça, que sempre considera seu corpo como parte integrante do trabalho, através de sua presença ou ausência. “Há uma forma de sintonia que se manifesta como prática espiritual”, diz Mombaça, “e não sinto corpo e espírito como entidades separadas.”

Essa busca contínua pelo equilíbrio e por maneiras de sair de um beco sem saída ocidental caracteriza ainda mais o espírito de A CERTAIN DEATH / THE SWAMP, que usa a água como mote central, recorrente em toda a exposição pela percepção de seu potencial violento e destrutivo. “O mote da inundação está presente desde meu projeto em Veneza no ano passado (principalmente em relação à elevação do nível do mar)”, explica ela. “Mas com esse projeto, ele ganhou novos significados, ou seja, abriu caminho para considerarmos as maneiras como os ciclos de água desequilibrados produzem imagens planetárias de cidades transformadas em pântanos pós-apocalípticos devido a inundações repentinas.” Aqui, Mombaça faz também alusão à inundação maciça que atingiu partes da parte ocidental da Alemanha após as tempestades de 2021, quando mais de 17.000 pessoas perderam suas casas.

A CERTAIN DEATH / THE SWAMP analisa as condições ambientais desastrosas em que nosso planeta se encontra atualmente, sem desconsiderar as especificidades locais e regionais. Ao apontar repetidamente para a causa – a modernidade colonial – e para a forma como ela também começou a assombrar seu principal agente, o Ocidente, a exposição é um testemunho da impossibilidade final: continuar exterritorializando o desastre, a catástrofe e a tragédia.

Jota Mombaça é artista interdisciplinar cujo trabalho se desenvolve a partir de poesia, teoria crítica, estudos queer, interseccionalidade política, justiça anticolonial e redistribuição da violência. Mombaça se define como uma bicha trans e racializada, nascida e criada em Natal, no nordeste do Brasil. Nos últimos anos, Mombaça tem explorado a relação entre monstruosidade e humanidade, bem como as tensões entre ética, estética, arte e política nas produções de conhecimento do Sul global.

Magnus Elias Rosengarten é escritor e curador vivendo atualmente em Paris.

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