Exposições de Carmézia Emiliano, Movimento dos Artistas Huni Kuin (MAHKU), Paul Gauguin, Sheroanawe Hakihiiwe, Melissa Cody, além do comodato MASP Landmann de cerâmicas e metais pré-colombianos e a grande coletiva Histórias indígenas integram o programa do ano do MASP.
Duhigó (São Gabriel da Cachoeira, Amazonas, Brasil, 1957), Nepu Arquepu [Rede Macaco], 2019. Acrilica sobre madeira, 185,5 x 275,5 cm. Acervo Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand. Doação: Fabio Ulhoa Coelho e Monica Andrigo Moreira de Ulhoa Coelho, 2021. Foto: Edson Kumasaka
A programação do MASP de 2023 traz m olhar voltado às diferentes histórias indígenas ao redor do mundo. Ao longo do ano, será apresentada uma série de atividades — exposições, cursos, palestras, oficinas e publicações — que propõem abordar e debater a complexidade de materiais, culturas, filosofias e cosmologias indígenas, além de discutir as suas representações na arte e o silêncio da história oficial da arte em relação à produção artística indígena.
O programa do ano dá sequência às exposições dedicadas às Histórias no MASP, que acontecem desde 2016 e incluem Histórias da infância (2016), Histórias da sexualidade (2017), Histórias afro-atlânticas (2018), Histórias das mulheres, histórias feministas (2019), Histórias da dança (2020) e Histórias brasileiras (2021-22). A partir deste conceito, a série de 2023 propõe novas narrativas visuais, mais inclusivas, diversas e plurais sobre as histórias indígenas, trazendo uma diversidade de vozes, não somente na inserção no corpo de artistas e de obras nas exposições, como também em sua estrutura curatorial.
Carmézia Emiliano: árvore da vida 24.3—11.6.2023 Curadoria: Amanda Carneiro, curadora assistente, MASP
Carmézia Emiliano (Maloca do Japó, Normandia, Roraima, 1960) é uma artista de origem Macuxi. Na década de 1990, mudou-se para Boa Vista, quando também começou a pintar. Suas telas figuram paisagens, objetos da cultura material e o cotidiano de sua comunidade: “Minha arte é um serviço que presto à cultura do meu povo, essa é a maior de todas as felicidades”, conta a artista. Oriunda da região fronteiriça com a Venezuela e a Guiana, perto do monte Roraima, a artista reflete, com sua obra, a profusão de detalhes espelhados, intrincados e interconectados de sua observação da natureza e da vida em comunidade.
MAHKU: mirações 24.3—11.6.2023 Curadoria: Adriano Pedrosa, diretor artístico, MASP; Guilherme Giufrida, curador assistente, MASP; Ibã Huni Kuin, curador convidado
A exposição MAHKU: mirações marca os dez anos do coletivo MAHKU, Movimento dos Artistas Huni Kuin. Criado oficialmente em 2013, o grupo iniciou seus trabalhos de tradução de cantos tradicionais do povo Huni Kuin em desenhos figurativos em cursos de Licenciatura Indígena na Universidade Federal do Acre (UFAC). As pinturas realizadas pelo grupo originam-se tanto de traduções e registros de cantos, mitos e histórias de sua ancestralidade como de experiências visuais geradas pelos rituais de nixi pae, que envolve a ingestão de ayahuasca, denominadas mirações – que dá título à exposição no MASP.
Sala de vídeo: Coletivo Bepunu Mebengokré 24.3—18.6.2023 Curadoria: Edson Kayapó, curador-adjunto de arte indígena, MASP
O coletivo Bepunu Mebengokré, coordenado pelo jovem líder e cineasta Bepunu, tem assumido o protagonismo na apresentação das histórias e ancestralidades do povo Mebengokré para a sociedade não indígena por meio das tecnologias audiovisuais. Os caminhos percorridos pelos roteiros narrativos, bem como o foco das câmeras do coletivo, centram suas ações em cosmologias, nas relações com a floresta e na visibilidade das histórias silenciadas. A ideia do coletivo é facilitar o acesso da sociedade brasileira e da comunidade internacional às histórias dos antepassados Mebengokré, contribuindo com a efetivação dos direitos desse povo nos dias atuais e no combate ao ecocídio na Amazônia brasileira.
Paul Gauguin: o outro e eu 28.4—6.8.2023 Curadoria: Adriano Pedrosa, diretor artístico, MASP; Fernando Oliva, curador, MASP; Laura Cosendey, curadora assistente, MASP
Paul Gauguin: o outro e eu é a primeira exposição a problematizar a relação de Gauguin com a ideia de alteridade e da exotização do “outro”. De maneira crítica, a mostra aborda problemáticas centrais em sua obra e tem como foco dois temas emblemáticos: seus autorretratos e seus trabalhos produzidos no Taiti (Polinésia Francesa), onde realizou suas pinturas mais conhecidas e passou a maior parte da última década de sua vida. Seus trabalhos desse período suscitam temas como as contestadas noções de primitivismo, um imaginário sobre o “exótico” e os “trópicos”, e apropriação cultural; além de questões relacionadas à sexualidade, androginia e erotização do orpo feminino. Paul Gauguin: o outro e eu investiga a tensão entre sua biografia, a imagem que criou de si mesmo enquanto artista, e a maneira como sua obra reforçou um imaginário sobre o “outro”. O Taiti que Gauguin representou ia além da realidade encontrada por ele, reproduzindo as fantasias que um homem europeu tinha de uma ilha paradisíaca, intocada pela “civilização” europeia. A exposição faz parte de uma série de mostras que procuram analisar, a partir de perspectivas críticas, artistas europeus canônicos presentes no acervo do MASP — que possui duas obras de Gauguin —, problematizando sua obra à luz de questões contemporâneas. A exposição conta com obras fundamentais do artista reunidas por meio de empréstimos internacionais de museus como Metropolitan Museum (Nova York), National Gallery of Art (Washington), J. Paul Getty Museum (Los Angeles), Musée d’Orsay (Paris), Tate (Londres), National Gallery (Londres), entre outras instituições dos Estados Unidos e da Europa.
Sheroanawe Hakihiiwe 30.6—24.9.2023 Curadoria: André Mesquita, curador, MASP; David Ribeiro, assistente curatorial, MASP
Nascido em 1971 na comunidade indígena Sheroana, na Amazônia venezuelana, Hakihiiwe vive hoje entre Caracas e Mahekototeri, comunidade na região do alto Orinoco. Através do desenho, o artista realiza um trabalho que resgata tradições ancestrais e a arte encontrada no cotidiano de sua comunidade, presente nas pinturas corporais e em utensílios domésticos. O artista produz desenhos mínimos e abstratos, com linhas retas e curvas, pontos e formas que retomam essas referências, bem como a fauna e a flora das florestas, elaborando uma inusitada gramática visual conectada às cosmologias amazônicas. Hakihiiwe começou a produzir na década de 1990, a partir de seu encontro com a artista mexicana Laura Anderson Barbata. Juntos, desenvolveram uma técnica de produção de papel com fibras vegetais nativas — material que o artista utiliza como suporte para seus desenhos.
Comodato MASP Landmann — cerâmicas e metais pré-colombianos 30.6—10.9.2023 Curadoria: Marcia Arcuri, curadora-adjunta de arte pré-colombiana, MASP; com assistência de Leandro Muniz, assistente curatorial, MASP
A exposição Comodato MASP Landmann — cerâmicas e metais pré-colombianos reunirá aproximadamente 750 peças arqueológicas produzidas pelos povos ameríndios, entre os séculos 7 a.C. e 16. Os objetos testemunham o vasto legado histórico e científico construído pelas sociedades antigas do continente americano. A mostra apresenta artefatos arqueológicos atribuídos a culturas que floresceram remotamente nas regiões do Peru, Bolívia, Equador e Colômbia — tais como Chavin, Paracas, Nasca, Moche, Huari, Lambayeque, Chimu, Chancay, Inca, Calima, Tolima, Zenú, Muísca, assim como peças Marajoara, da Amazônia brasileira.
Sala de vídeo: Sky Hopinka 30.6—13.8.2023 Curadoria: María Inés Rodríguez , curadora-adjunta de arte moderna e contemporânea
Sky Hopinka (Ho-Chunk Nation/Pechanga Band of Luiseño Indians) nasceu e cresceu em Ferndale, Washington e passou vários anos em Palm Springs e Riverside, Califórnia, Portland, Oregon e Milwaukee, Wisconsin. Em Portland, estudou e ensinou chinuk wawa, uma língua nativa da bacia do rio Columbia. Seus vídeos, fotos e textos giram em torno de sua opinião sobre a paisagem e a terra indígena.
Sala de vídeo: Brook Andrews 25.8—8.10.2023 Curadoria: Leandro Muniz, assistente curatorial, MASP
A partir de materiais de arquivos, que incluem fotografias dos séculos 19 e 20, filmes, desenhos animados, entrevistas e notícias, o artista e curador australiano Brook Andrew investiga as formas de representação e preservação de memória dos povos aborígenes, em especial os Wiradjuri e Ngunawal, dos quais é descendente junto a celtas e judeus. Além de discutir as opressões históricas e relações de poder desenvolvidas no processo de colonização do território australiano, Andrew interessa-se pelos fluxos culturais estabelecidos nesse período. Sua obra é marcada por um raciocínio de colagem, contrapondo documentos e cores ácidas, grafismos dos povos originários e pinturas murais, palavras na língua Wiradjuri e neons. Seus vídeos radicalizam ainda mais essa estrutura disjuntiva: utilizando edições abruptas e um tipo de linguagem de desktop, o artista contrasta os diferentes materiais coletados em suas pesquisas, criando narrativas fragmentárias que questionam apagamentos sociais, estruturas jurídicas e culturais.
Histórias indígenas 20.10.2023—25.2.2024 Organizada pelo MASP em colaboração com o Kode Bergen Art Museum, Noruega Curadoria: Edson Kayapó, curador-adjunto de arte indígena, MASP, Kassia Borges Karajá, curadora-adjunta de arte indígena, MASP, e Renata Tupinambá, curadora-adjunta de arte indígena, MASP. Curadoria convidada: Abraham Cruzvillegas (México), Irene Snarby (Sámi, Noruega), Nigel Borell (Maori, Nova Zelândia) e Sandra Gamarra (Peru), entre outros.
A grande exposição coletiva Histórias indígenas apresenta diferentes relatos de histórias indígenas do mundo, por meio da arte e das culturas visuais, reunindo obras de múltiplas mídias, tipologias, origens e períodos. Apesar do alcance internacional e da amplitude temporal da exposição, não se trata de uma abordagem abrangente, nem enciclopédica — pelo contrário. Nesse sentido, é importante levar em consideração o significado particular de “histórias” em português, que é bastante diferente do termo correspondente em inglês. O termo “histórias” engloba tanto a ficção quanto a não ficção, tanto relatos históricos quanto pessoais, de natureza pública e privada, em nível micro ou macro, e, portanto, possui uma qualidade mais polifônica, especulativa, aberta, incompleta, processual e fragmentada do que a noção tradicional de história.
Histórias indígenas compreende oito núcleos: sete dedicados a diferentes regiões do mundo e um temático, em torno de ativismos indígenas. Os sete núcleos regionais abordarão histórias indígenas de diferentes territórios da Oceania, da América do Norte, da América do Sul e da Escandinávia. O objetivo não é o de representar de maneira completa as vastas e complexas histórias indígenas de cada região em particular, mas sim o de fornecer um corte transversal, um fragmento ou uma amostra dessas histórias em uma seleção concisa, mas relevante, para que esse corte possa ser justaposto com outros de diferentes partes do mundo. Cada um dos núcleos regionais terá curadoria ou cocuradoria de curadores indígenas ou artistas de origem indígena.
Melissa Cody 20.10.2023—25.2.2024 Curadoria: Isabella Rjeille, curadora, MASP
Melissa Cody (1983, No Water Mesa, Arizona, EUA) é uma artista Navajo que pertence à quarta geração de artistas de sua família. As tecelagens de pequenas, médias e grandes proporções de Cody são feitas a partir de tradicional técnica de seu povo e transmitidas de geração em geração. Seu estilo está associado ao Germantown Revival, um movimento estilístico de tecelagem que recebeu o nome da lã que o governo de Germantown, Pensilvânia (EUA), forneceu ao povo indígena durante o episódio histórico que ficou conhecido como “Long Walk” (1864). Este episódio narra a migração forçada do povo Navajo de suas terras tradicionais no Arizona para o Novo México em uma medida adotada pelo governo dos Estados Unidos. Essa deportação impactou profundamente a noção contemporânea de identidade e território dos Navajo. Em sua obra, Cody mistura padrões e símbolos tradicionais navajo com referências desde o mundo pixelado dos computadores até universo pop, combatendo os processos que buscam fixar as culturas indígenas em um passado idílico.
Sala de vídeo: Glicéria Tupinambá e Alexandre Mortágua 20.10—3.12.2023 Curadoria: Renata Tupinambá, curadora-adjunta de arte indígena, MASP
Para a Sala de vídeo, Glicéria Tupinambá e Alexandre Mortágua apresentam Quando o manto fala e o que o manto diz (2023). O filme registra o processo de Glicéria Tupinambá em reconectar-se com os saberes adormecidos de sua aldeia. O manto tupinambá ganha uma nova voz pelas mãos da artista da Serra do Padeiro.
Sala de vídeo: Cecília Vicuña 15.12.2023—28.1.2024 Curadoria: Kássia Borges, curadora-adjunta de arte indígena, MASP
Cecília Vicuña Ramírez (Santiago, 22 de julho de 1948) é uma poetisa, cineasta e artista visual chilena radicada em Nova York. Seu trabalho versa sobre os temas da memória, ecologia, direitos humanos e feminismo. Em sua pesquisa, faz uma crítica ao mundo moderno e às políticas de destruição ecológica e da homogeneização cultural. Suas práticas artísticas estão ligadas às agendas do feminismo e da natureza, o que fez com que a artista tenha sido ligada ao termo ecofeminismo. Ao articular poesia, vídeo, pintura e ritual, a artista chilena resgata saberes indígenas sobre o poder das mulheres e dos saberes dos seres da floresta. Numa bricolagem entre história e mitos, Cecília cria uma obra heterogênea, pungente, real e sensível.
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