Brasil

Waleff Dias e a identidade dos corpos masculinos negros

Com trabalho selecionado para a mostra Dos Brasis – Arte e Pensamento Negro, dedicada exclusivamente à produção de artista negros, o artista, originário do estado do Amapá, reflete sobre o processo de mestiçagem no extremo Norte do Brasil.

Na academia, em seu processo de doutorado, Dias pesquisa autoimagem a partir do processo étnico-racial. No campo da arte, é um artista interdisciplinar e, por meio das aparições/performances, conceito que empresta da artista sul-africana Lhola Amira, desenvolve ações performáticas, fotos, instalações, textos, audiovisuais e outros.

“Busco rememorar o que meus ancestrais viveram e elaborar procedimentos perecíveis”, diz. É o que faz no filme Lembrar que a dor não é o único jeito de existir. No curta, o artista investiga a masculinidade e sua formação enquanto homem através da relação com o pai, homem negro de pele escura. Na sinopse, a informação de que o filme é baseado no diálogo com a figura paterna: um lembrete a homens negros do encontro do hoje no amanhã sobre a ausência que surgiu ontem. “O filme nasce de uma violência física que vivi, onde ouvi duas frases, ‘ ser agredido te deixou com a pele mais bonita’, e a principal, ‘quem vai querer ouvir um homem negro?’”, relata o artista.

Segundo ele, na condição de negro, mesmo sendo a vítima, automaticamente era o errado no sistema. “Retorno para a casa dos meus pais e percebo um homem tão calado quanto eu”, conta Waleff Dias. “E o filme é o diálogo com meu pai, forjando um lugar de existência para além da violência.”

Depois de participar de várias exposições, Dias, que atualmente mora no Rio de Janeiro, onde cursa doutorado, celebra o fato de ser um dos 240 artistas que exibirão seus trabalhos na mostra Dos Brasis, mas lamenta ser o único representando o Estado onde nasceu. “Estou mega feliz de estar junto com tantos artistas negros e amigos que admiro, mas, ao mesmo tempo, com um gosto estranho, por ser o único artista negro do Amapá”, diz.

Na mostra, aberta em agosto de 2023 no Sesc Belenzinho, em São Paulo, e que rodará o Brasil de forma itinerante por dez anos, o trabalho Até os filhos do urubu nascem brancos surge pelos registros do fotógrafo Pablo Bernardo.

Uma das principais premissas da mostra Dos Brasis é dar centralidade ao pensamento negro no campo das artes visuais brasileiras em diferentes tempos e lugares. Com curadoria geral de Igor Simões, a exposição reúne trabalhos produzidos desde o século XVIII em diversas linguagens artísticas, como pintura, fotografia, escultura, instalações e videoinstalações.

Waleff Dias é doutorando em Psicologia e mestre em artes visuais. O artista usa o corpo como suporte para sua arte. Em suas aparições/performances reflete sobre o processo de miscigenação e a construção identitária dos corpos masculinos negros. Vive entre o Amapá, na região Norte, onde nasceu, e o Rio de Janeiro, onde dá continuidade a seus estudos acadêmicos.

Fábia Prates é jornalista e escritora.

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