Na língua iorubá, ireti significa esperança ou expectativa positiva em relação ao futuro. Assim se chama o projeto que completou um ano em fevereiro, criado por Katiuska Govin no seu próprio lar.
Biblioteca Ireti. Foto: Mónica María Oberschelp Garabito
Visitar este espaço é uma experiência excepcional, quase íntima. Após entrar em contato com Katiuska, é ela própria que dá o endereço. Depois de combinar a visita, abre as portas de sua casa, localizada em El Cerro, um bairro tão central quanto historicamente marginalizado de Havana. Uma vez dentro da livraria, você se encontra em um lugar orgânico, onde se cultiva a consciência negra e a justiça epistemológica. Em suas estantes habitam obras raras e diversas, em temáticas como poesia, panafricanismo, contos infantis africanos, teatro, cinema e culinária, entre outras, a maioria escrita por e para pessoas negras. Muitas destas joias foram resgatadas por Katiuska ao rastrear livrarias públicas e particulares em toda a ilha. Em seu catálogo, as vozes de autores afrodescendentes de Cuba, do continente africano e da diáspora dialogam.
Compartilho aqui cinco esboços literários indispensáveis para saborear a riqueza da cultura negra cubana:
REYITA, SENCILLAMENTE (REYITA, SIMPLESMENTE), de Daisy Rubiera Castillo (Havana, 1997). Foto: Mónica María Oberschelp Garabito
Ler esta biografia testimonial é viajar no tempo e se deixar guiar pela rica experiência de María de los Reyes Castillo, ou, simplesmente, Reyita, uma mulher negra que viveu durante a fundação da república e a revolução cubana, enfrentando as consequências do sistema escravista. O livro foi escrito por sua filha, Daisy Rubiera, uma das grandes escritoras e sábias do movimento antirracista em Cuba, também conhecida como uma das Ceibas Vivas.
POESÍA COMPLETA, de Georgina Herrera (Havana, 2016). Foto: Mónica María Oberschelp Garabito
Georgina Herrera é uma das grandes poetisas negras mais desconhecidas, tanto em Cuba quanto internacionalmente. Foi uma mulher que se autodenominava cimarrona (uma resistente, como uma quilombola), capaz de curar as feridas da exclusão racial por meio de seus versos e de sua prosa. Sua obra completa é uma compilação de sua ampla produção poética, na qual se entrelaçam memória, resistência e uma profunda conexão com suas raízes africanas.
SARA GÓMEZ. UN CINE DIFERENTE, de Olga García Yero (Havana, 2017). Foto: Mónica María Oberschelp Garabito
Escrito pela professora Olga García Yero, este ensaio foi publicado pela Ediciones ICAIC (Instituto Cubano de Arte e Indústria Cinematográficas). Sara Gómez foi a primeira cineasta negra formada pelo ICAIC. Em seu cinema, abordou as interseções entre racialização, papéis de gênero e conflitos de classe, ao mesmo tempo em que destacou o legado africano como componente primordial da cultura cubana, tudo através de uma estética pioneira. O ensaio oferece um olhar detalhado sobre sua produção documental de curta-metragens, bem como sobre sua única obra de ficção em formato de longa-metragem.
LA CULTURA RASTAFARI EN CUBA, de Samuel Furé Davis (Santiago de Cuba, 2011). Foto: Mónica María Oberschelp Garabito
Esta obra apresenta um estudo sociocultural que examina a chegada, o desenvolvimento e o auge do movimento rastafari na ilha. O ensaio é resultado de uma pesquisa de dez anos realizada por Furé Davis. Proporciona, além disso, um enfoque especial sobre o reggae enquanto força expressiva da cultura e da espiritualidade rastafari no contexto cubano. Inclui, ademais, um glossário de termos rastafari cubanos e uma tabela denominada Rastadata, com referências às pessoas entrevistadas.
Recopilación de textos sobre NICOLÁS GUILLÉN (Compilação de textos sobre NICOLÁS GUILLÉN – Casa de las Américas, Havana, 1974). Foto: Mónica María Oberschelp Garabito
Nicolás Guillén é um dos poetas e intelectuais afrodescendentes mais reconhecidos de Cuba. Realizada pela poetisa negra Nancy Morejón, a compilação de textos dedicada a ele reúne cuidadosamente poesias, artigos, entrevistas e ensaios que analisam e celebram sua obra. Nancy Morejón, uma das vozes negras mais destacadas e influentes da literatura cubana contemporânea, oferece um olhar profundo e sensível sobre a herança literária de Guillén.
Mónica Garabito é pesquisadora e artista radicada em São Paulo, Brasil. Nascida em Cuba e criada na Alemanha, formou-se em Antropologia e Cinema Documental em instituições de Cuba, México e Alemanha. Seu trabalho propõe novas formas de escuta e presença, em diálogo com comunidades afrodiaspóricas, memórias coletivas e epistemologias não hegemônicas, questionando as formas coloniais de ver, ouvir e narrar o mundo.
Tradução: Marie Leão