Concreto Blues

Uma nova série fotográfica de Kiluanji Kia Henda sobre a urbanização de Angola

Com a nova exposição individual intitulada Concreto Blues, o artista que vive em Angola Kiluanji Kia Henda volta ao tema da cidade, inserindo a degradação urbana na retórica politizada da modernização e do desenvolvimento metropolitano de Luanda. O artista foca no que realmente significa para o corpo habitar uma cidade não “construída para o si mesmo”, como escreve Ludmila Böse.

Este não é um caso categórico de alienação urbana. O artista apresenta um corpo cuja existência sempre foi afastada às franjas da cidade. Há uma história por trás desse corpo; sua criação como sujeito excluído faz parte do legado da urbanização colonial perpetrada por escolhas atuais do desenvolvimento moderno. A contínua marginalização desse corpo cria uma existência em relação a seu ambiente apenas na medida em que é capaz de assumir qualquer forma de adaptação e sobrevivência à montagem vertiginosa de novos ambientes urbanos, ricos ou pobres.

Na sua história de exclusão, esse corpo é aprisionado pelo desejo de ser incluído. Mas, “ao carecer de uma essência própria para proteger e salvaguardar”, desmorona e degrada em conteúdo; em compensação, o tijolo de concreto bruto é oferecido para construir a forma desse desejo.

O tijolo de concreto bruto é o leitmotiv da exposição e o ponto crucial da urbanização de Luanda. De um lado, as paredes que ele ergue são louvadas como uma conquista, como um progresso autoevidente. Por outro lado, é um mimetismo que nos condena ao “aprendizado para a vida toda” de conceitos que continuamos a “não entender direito”.

O resultado é o corpo fragmentado, cujo valor não se conforma às normas do mercado, para o qual a humanidade é considerada supérflua e de quem é inexoravelmente exigido fluxo, para ajustar-se, tornar-se outro.

Concreto Blues documenta nosso próprio processo desumano de atender às demandas da modernidade, questionando a concepção e a construção de uma cidade em rápida expansão que parece ser construída para alguém que não nós mesmos. Isso leva a uma profunda reflexão sobre nosso próprio conceito de cidade e o que significa para nós sermos urbanos – além do tijolo de concreto bruto.

Podemos ter muito o que falar sobre o estado de nossas cidades africanas, mas parece que são nossas cidades que falam extensivamente sobre o estado de nós mesmos.

Concreto Blues, de Kiluanji Kia Henda, está em exibição no espaço Jahmek Contemporary Art em Luanda, Angola, até 1º de junho de 2019.

Ludmila Böse é uma escritora de Luanda, Angola. Colaborou com o programa educativo e com textos curatoriais para a exposição “A Sul. O Sombreiro” (2016/2017), da artista que vive em Angola Iris Buchholz Chocolate, com a qual fundou o Projeto Lugânzi, com o foco em opções decoloniais. É apoiadora da filosofia africana contemporânea e segue de perto discursos latino-americanos sobre a modernidade, colonialidade e decolonialidade. Böse participou do Programa de Tutoria e do Workshop de Escrita Crítica promovido pela C& em Luanda em 2018, com apoio da Ford Foundation.

Traduzido do inglês por Raphael Daibert.

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